terça-feira, 28 de setembro de 2010

EBC realiza Encontro com Rádios Públicas

EBC realiza Encontro com Rádios Públicas

Por iniciativa conjunta da Diretoria de Jornalismo (DIJOR) e da Superintendência de Rádio (SURAD), a EBC realizou o 'Encontro com Rádios Públicas' (educativas, culturais, universitárias), na última terça-feira, 21 de setembro, em sua nova sede, em Brasília. Estiveram presentes 25 emissoras públicas de rádio, representando 16 Unidades da Federação, algumas ligadas a instituições federais e outras a governos estaduais (veja lista em anexo). O encontro teve como objetivo debater uma proposta de cobertura conjunta das eleições/apuração, além de outras iniciativas visando a construção de uma futura rede pública nacional de rádios. A diretora-presidente da EBC, Tereza Cruvinel, fez uma saudação de boas vindas aos representantes das rádios públicas presentes, antes do início dos trabalhos. Nereide Beirão, diretora de Jornalismo, e Orlando Guilhon, superintendente de Rádio, fizeram a abertura oficial do encontro, explicando seus objetivos e a pauta do mesmo. Em seguida, cada participante fez a sua apresentação e a de sua respectiva emissora.

Como primeiro ponto da pauta, Taís Ladeira, gerente regional de Brasília da Superintendência de Rádio, e Lúcio Haeser, coordenador de Radiojornalismo da Diretoria de Jornalismo, apresentaram a proposta de cobertura conjunta para o dia 3 de outubro. Das 8 h às 17 h, a cada uma hora, haverá 20 minutos de cobertura local, de responsabilidade de cada emissora, 20 minutos de cobertura nacional (as emissoras locais e repórteres da EBC – rádios, agência, tv - entrarão em rede, com matérias, entrevistas, reportagens, notas), e outros 20 minutos voltam a ser de cobertura local . Os 20 minutos de cobertura nacional serão disponibilizados no satélite, e poderão ser utilizados (veiculados) por todas as rádios públicas do país. Após às 17 h, a rede será 'desfeita', e cada emissora voltará a fazer a cobertura a partir de suas equipes locais, já com o foco na apuração.

A cobertura se pautará pelos princípios que norteiam o jornalismo público, com o foco na prestação se serviços, no fortalecimento da cidadania e no interesse público. Como material de apoio, a EBC distribuiu na reunião o documento 'Atos Normativos da EBC para o período eleitoral', contendo o Plano Editorial de Cobertura Jornalística dos Canais EBC e as Normas de Conduta para o Período Eleitoral. A participação na programação conjunta das eleições será opcional a cada emissora, mas a proposta foi muito bem acolhida por todos os participantes do encontro, e já foi anunciada a adesão de outras emissoras públicas que não puderam participar do evento, mas que estarão fazendo parte da rede no dia da cobertura especial conjunta.

Em seguida, Eurico Tavares, assessor da Diretoria de Jornalismo, e Fábio Petrillo, gerente da Diretoria de Tecnologia de Informação e Comunicação, apresentaram aos participantes a ferramenta tecnológica que será usada pelos editores e âncoras das rádios da EBC, que permitirá acesso rápido às totalizações feitas pelo TSE. Foi explicado também que uma planilha simplificada destes dados estará sempre disponível no site da Agência Brasil ("www.agenciabrasil.com.br" www.agenciabrasil.ebc.com.br).

Na parte da tarde, foram abordados outras iniciativas no âmbito de uma possível construção de uma rede pública nacional de rádio. Xico Teixeira, assessor da Superintendência de Rádio, discorreu sobre algumas experiências de coberturas conjuntas de vários tipos de eventos (políticos, sociais, culturais/musicais, esportivos) que têm sido feitas a partir de um pool de emissoras públicas de rádio, com relativo sucesso. Profissionais são deslocados de diversas emissoras para uma mesma localidade, compondo uma equipe multidisciplinar (repórteres, produtores, assistentes de produção, operadores de áudio, locutores-apresentadores), sempre sob coordenação de uma das emissoras. As coberturas recentes da Feira Música Brasil, do Fórum Social Mundial, da Feira de Música de Fortaleza, da Feira Literária de Paraty, foram alguns dos exemplos citados. O debate permitiu listar alguns eventos próximos que merecerão uma atenção especial de todas as emissoras públicas de rádio: Círio de Nazaré, SBPC, Festival Contato (São Carlos), entre outros.

Outro ponto abordado foi a necessidade de uma maior sinergia na área do radiojornalismo, entre as produções das rádios da EBC e das demais emissoras públicas de rádio. Lúcio Haeser apresentou os principais radionoticiários produzidos pela equipe de radiojornalismo da DIJOR, e que são veiculados pelas Rádios da EBC: o Repórter Brasil, o Repórter Nacional e o Nacional Informa. Ele disse que várias emissoras públicas estaduais já contribuem para o conteúdo desses radionoticiários, enviando matérias, reportagens, entrevistas, que tem sido bem aproveitadas, na busca de dar uma identidade mais nacional a estes produtos. Mas, incentivou a que esta parceria seja ampliada e aprofundada.

Na sequência, Orlando Guilhon, resgatou a proposta construída no âmbito dos grupos de trabalho e das assembléias da ARPUB, da produção de um futuro 'Radiojornal de Rede', um radionoticiário de uma hora de duração, com 40 minutos de notícias e coberturas nacionais e internacionais e 20 minutos de notícias e coberturas locais, pautado nos princípios que devem nortear o jornalismo público. A proposta é de uma construção compartilhada com todas as emissoras públicas espalhadas pelo país, com coordenação geral do Radiojornalismo da EBC (DIJOR), que pudesse ter mini editorias regionais, enfim um produto a ser construído a várias mãos.

Em seguida, foi abordado o tema das plataformas de troca de conteúdos. Juliana Nunes, coordenadora da Radioagência Nacional ("www.radioagencianacional.com.br" www.radioagencianacional.ebc.com.br), expôs a experiência da Radioagência Nacional, que teve seu lay out recentemente renovado, assim como a sua plataforma tecnológica modernizada e reforçada. Na radioagência ficam disponibilizadas matérias e produtos radiofônicos das emissoras de rádio da EBC, assim como de emissoras parceiras. Ela lembrou que já existem cerca de 8 mil usuários cadastrados, que utilizam esses materiais diariamente, sendo que no ano passado os acessos ultrapassaram a casa dos 600 mil.

Logo depois, Bráulio Ribeiro, assessor da Superintendência de Rádio, apresentou aos participantes do evento a nova plataforma tecnológica de troca de conteúdos, adquirida recentemente pela EBC: o ITVp, desenvolvido pela RNP (Rede Nacional de Pesquisa), do Ministério de Ciência e Tecnologia. Bráulio explicou que as equipes das Rádios da EBC estão se capacitando para se apropriarem desta ferramenta e que, num futuro próximo, esta capacitação deverá atingir os profissionais das demais emissoras públicas brasileiras, permitindo uma intensa troca de conteúdos e compartilhamento de programações. O ITVp, antes utilizado apenas para troca de conteúdos audiovisuais (vídeos) entre as emissoras da rede pública nacional de tv, tende a se transformar também numa futura 'cesta básica de produtos radiofônicos', e poderá alimentar a futura rede pública nacional de rádios. Bráulio estimulou a que os interessados em se cadastrarem no ITVp enviem mensagem nesse sentido para o seu e-mail (braulio@ebc.com.br), para que ele possa ir agregando os novos usuários, aos poucos.

Por fim, no último ponto de pauta previsto para o encontro, foi abordado o tema da construção futura de uma rede pública nacional de rádios. Orlando Guilhon explicou que a EBC tem uma Superintendência de Rede (representada no evento por Klaus Ferreira, Gerente), responsável pelas iniciativas de uma política de rede. Lembrou que, recentemente, a EBC conseguiu lançar a Rede Pública de TV, depois de mais de dois anos de intensas negociações e articulações, a partir da formatação de uma Norma de Rede Nacional de Comunicação Pública/TV. Agora é a vez da formatação das normas para o Rádio, para a qual todas as emissoras públicas locais e estaduais serão chamadas a discutir. O diálogo prioritário será com as rádios das Universidades Federais, por serem concessões da EBC, mas logo ele deverá se estender às demais emissoras.

Guilhon lembrou também que a pauta da reunião configurava o início de uma verdadeira política de construção dessa rede pública nacional de rádios: as coberturas especiais conjuntas, uma maior sinergia do radiojornalismo e as plataformas de trocas de conteúdos radiofônicos. Além disso, apontou outras quatro possibilidades de parcerias, que poderiam auxiliar na construção dessa rede: a produção de conteúdos radiofônicos (lembrou a recente experiência do I Prêmio Roquette-Pinto, que permitirá às rádios públicas brasileiras terem acesso a 240 horas de conteúdos radiofônicos inéditos), uma política de acervos (preservação, digitalização e disponibilização dos acervos de áudio das rádios), uma política de capacitação e requalificação profissional e, por fim, mas tão importante quanto, uma política de apoio na área tecnológica.

O tema suscitou diversas intervenções interessantes, todas apontando para a necessidade de construir uma futura rede pública nacional de rádios que seja baseada em princípios de parceria e compartilhamento, reconhecendo o papel importante que a EBC pode e deve cumprir nesse processo, mas sempre com a preocupação de respeitar as diversidades locais e regionais.

A siretora de Jornalismo, Nereide Beirão, fez o encerramento formal do evento, agradecendo a presença de todas e todos, destacando a produtividade do mesmo, e prevendo que a cobertura especial conjunta das eleições/apuração das emissoras públicas de rádio será um sucesso. Vários representantes das diversas emissoras presentes aproveitaram para elogiar a iniciativa da EBC e colocar suas emissoras a serviço deste projeto.





Brasília, 24 de setembro de 2010

Fonte: Site da EBC

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Lula devolve a Petrobrás aos brasileiros e o artigo do Leonardo Boff

FALTAM NOVE DIAS

LULA DEVOLVE A PETROBRAS AOS BRASILEIROS

Agência Carta Maior

CAPITALIZAÇÃO TRANSFORMA A EMPRESA QUE OS TUCANOS QUERIAM DESMONTAR NA 2º MAIOR PETROLEIRA DO MUNDO

Nesta sexta-feira, o Presidente Lula abriu o pregão da Bolsa de Valores de São Paulo; não para vender o patrimônio público, como fez o governo tucano nos anos 90, mas para coroar o êxito do maior lançamento de ações da história econômica mundial. A capitalização da Petrobrás eleva a 48% participação do Estado brasileiro no controle acionário da empresa e reverte o desmonte arquitetado pela gestão FHC destinado a fatiar, privatizar e pulverizar o comando da mais estratégica empresa do Brasil. O sucesso assegurado da capitalização torna a Petrobrás a segunda maior petroleiro do mundo e viabiliza a soberania brasileira na exploração das jazidas do pré-sal, reconhecidas como a mais importante descoberta de petróleo dos últimos 30 anos. As forças e interesses reunidos em torno da coalizão demotucano mais de uma vez manifestaram sua preferencia por entregar a guarda desses recursos à 'eficiencia dos livres mercados', leia-se, às petroleiras internacionais. Na votação dos marcos regulatórios que asseguram o controle nacional sobre prováveis 50 bilhões de barris de petróleo armazenados no fundo do oceano, o senador Álvaro Dias (PSDB-PR), cogitado como vice de Serra, foi categórico: 'Resistiremos o máximo'. O Presidenciável não deixou por menos. Serra insistiu até o último minuto no adiamento dessa decisão e sinalizou que poderia revertê-la , se vitorioso nas urnas. Acima de tudo , porém, o que o ex-governador de SP mais temia era o simbolismo histórico explosivo, intrinsecamente desfavorável a sua candidatura, condensado na cerimonia protagonizada por Lula nesta sexta-feira que, a nove dias das eleições, contrapõe, objetivamente, dois projetos de país. (Carta Maior, 24-09)

"A imprensa pode criticar, mas não quer ser criticada"

Centenas de pessoas lotaram auditório do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo em ato contra golpismo midiático e em defesa da democracia e da liberdade de expressão. Manifesto afirma que, em nome da liberdade de imprensa, grande mídia comercial quer suprimir a liberdade de expressão. "A imprensa pode criticar, mas não quer ser criticada. É profundamente anti-democrático – totalitário mesmo – caracterizar qualquer crítica à imprensa como uma ameaça à liberdade de imprensa. Os meios de comunicação exerceram, nestes últimos oito anos, sua atividade sem nenhuma restrição por parte do Governo", diz o documento.

>| Política | 24/09/2010


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A mídia comercial em guerra contra Lula e Dilma

O que está ocorrendo já não é um enfrentamento de idéias e de interpretações e o uso legítimo da liberdade da imprensa. Está havendo um abuso da liberdade de imprensa que, na previsão de uma derrota eleitoral, decidiu mover uma guerra acirrada contra o Presidente Lula e a candidata Dilma Rousseff. Nessa guerra vale tudo: o factóide, a ocultação de fatos, a distorção e a mentira direta. Precisamos dar o nome a esta mídia comercial. São famílias que, quando vêem seus interesses comerciais e ideológicos contrariados, se comportam como “famiglia” mafiosa. O artigo é de Leonardo Boff.

Leonardo Boff

Sou profundamente pela liberdade de expressão em nome da qual fui punido com o “silêncio obsequioso”pelas autoridades do Vaticano. Sob risco de ser preso e torturado, ajudei a editora Vozes a publicar corajosamente o “Brasil Nunca Mais” onde se denunciavam as torturas, usando exclusivamente fontes militares, o que acelerou a queda do regime autoritário.

Esta história de vida, me avaliza para fazer as críticas que ora faço ao atual enfrentamento entre o Presidente Lula e a midia comercial que reclama ser tolhida em sua liberdade. O que está ocorrendo já não é um enfrentamento de idéias e de interpretações e o uso legítimo da liberdade da imprensa. Está havendo um abuso da liberdade de imprensa que, na previsão de uma derrota eleitoral, decidiu mover uma guerra acirrada contra o Presidente Lula e a candidata Dilma Rousseff. Nessa guerra vale tudo: o factóide, a ocultação de fatos, a distorção e a mentira direta.

Precisamos dar o nome a esta mídia comercial. São famílias que, quando vêem seus interesses comerciais e ideológicos contrariados, se comportam como “famiglia” mafiosa. São donos privados que pretendem falar para todo Brasil e manter sob tutela a assim chamada opinião pública. São os donos do Estado de São Paulo, da Folha de São Paulo, de O Globo, da revista Veja na qual se instalou a razão cínica e o que há de mais falso e chulo da imprensa brasileira. Estes estão a serviço de um bloco histórico, assentado sobre o capital que sempre explorou o povo e que não aceita um Presidente que vem deste povo. Mais que informar e fornecer material para a discussão pública, pois essa é a missão da imprensa, esta mídia empresarial se comporta como um feroz partido de oposição.

Na sua fúria, quais desesperados e inapelavelmente derrotados, seus donos, editorialistas e analistas não têm o mínimo respeito devido à mais alta autoridade do pais, ao Presidente Lula. Nele vêem apenas um peão a ser tratado com o chicote da palavra que humilha.

Mas há um fato que eles não conseguem digerir em seu estômago elitista. Custa-lhes aceitar que um operário, nordestino, sobrevivente da grande tribulação dos filhos da pobreza, chegasse a ser Presidente. Este lugar, a Presidência, assim pensam, cabe a eles, os ilustrados, os articulados com o mundo, embora não consigam se livrar do complexo de vira-latas, pois se sentem meramente menores e associados ao grande jogo mundial. Para eles, o lugar do peão é na fábrica produzindo.

Como o mostrou o grande historiador José Honório Rodrigues (Conciliação e Reforma) “a maioria dominante, conservadora ou liberal, foi sempre alienada, antiprogresssita, antinacional e nãocontemporânea. A liderança nunca se reconciliou com o povo. Nunca viu nele uma criatura de Deus, nunca o reconheceu, pois gostaria que ele fosse o que não é. Nunca viu suas virtudes nem admirou seus serviços ao país, chamou-o de tudo, Jeca Tatu, negou seus direitos, arrasou sua vida e logo que o viu crescer ela lhe negou, pouco a pouco, sua aprovação, conspirou para colocá-lo de novo na periferia, no lugar que contiua achando que lhe pertence (p.16)”.

Pois esse é o sentido da guerra que movem contra Lula. É uma guerra contra os pobres que estão se libertando. Eles não temem o pobre submisso. Eles tem pavor do pobre que pensa, que fala, que progride e que faz uma trajetória ascendente como Lula. Trata-se, como se depreende, de uma questão de classe. Os de baixo devem ficar em baixo. Ocorre que alguém de baixo chegou lá em cima. Tornou-se o Presidene de todos os brasileiros. Isso para eles é simplesmente intolerável.

Os donos e seus aliados ideológicos perderam o pulso da história. Não se deram conta de que o Brasil mudou. Surgiram redes de movimentos sociais organizados de onde vem Lula e tantas outras lideranças. Não há mais lugar para coroneis e de “fazedores de cabeça” do povo. Quando Lula afirmou que “a opinião pública somos nós”, frase tão distorcida por essa midia raivosa, quis enfatizar que o povo organizado e consciente arrebatou a pretensão da midia comercial de ser a formadora e a porta-voz exclusiva da opinião pública. Ela tem que renunciar à ditadura da palabra escrita, falada e televisionada e disputar com outras fontes de informação e de opinião.

O povo cansado de ser governado pelas classes dominantes resolveu votar em si mesmo. Votou em Lula como o seu representante. Uma vez no Governo, operou uma revolução conceptual, inaceitável para elas. O Estado não se fez inimigo do povo, mas o indutor de mudanças profundas que beneficiaram mais de 30 milhões de brasileiros. De miseráveis se fizeram pobres laboriosos, de pobres laboriosos se fizeram classe média baixa e de classe média baixa de fizeram classe média. Começaram a comer, a ter luz em casa, a poder mandar seus filhos para a escola, a ganhar mais salário, em fim, a melhorar de vida.

Outro conceito inovador foi o desenvolvimento com inclusão soicial e distribuição de renda. Antes havia apenas desenvolvimento/crescimento que beneficiava aos já beneficiados à custa das massas destituidas e com salários de fome. Agora ocorreu visível mobilização de classes, gerando satisfação das grandes maiorias e a esperança que tudo ainda pode ficar melhor. Concedemos que no Governo atual há um déficit de consciência e de práticas ecológicas. Mas importa reconhecer que Lula foi fiel à sua promessa de fazer amplas políticas públicas na direção dos mais marginalizados.

O que a grande maioria almeja é manter a continuidade deste processo de melhora e de mudança. Ora, esta continuidade é perigosa para a mídia comercial que assiste, assustada, o fortalecimento da soberania popular que se torna crítica, não mais manipulável e com vontade de ser ator dessa nova história democrática do Brasil. Vai ser uma democracia cada vez mais participativa e não apenas delegatícia. Esta abria amplo espaço à corrupção das elites e dava preponderância aos interesses das classes opulentas e ao seu braço ideológico que é a mídia comercial. A democracia participativa escuta os movimentos sociais, faz do Movimento dos Sem Terra (MST), odiado especialmente pela VEJA faz questão de não ver, protagonista de mudanças sociais não somente com referência à terra mas também ao modelo econômico e às formas cooperativas de produção.

O que está em jogo neste enfrentamento entre a midia comercial e Lula/Dilma é a questão: que Brasil queremos? Aquele injusto, neocoloncial, neoglobalizado e no fundo, retrógrado e velhista ou o Brasil novo com sujeitos históricos novos, antes sempre mantidos à margem e agora despontando com energias novas para construir um Brasil que ainda nunca tínhamos visto antes.

Esse Brasil é combatido na pessoa do Presidente Lula e da candidata Dilma. Mas estes representam o que deve ser. E o que deve ser tem força. Irão triunfar a despeito das má vontade deste setor endurecido da midia comercial e empresarial. A vitória de Dilma dará solidez a este caminho novo ansiado e construido com suor e sangue por tantas gerações de brasileiros.

(*) Teólogo, filósofo, escritor e representante da Iniciativa Internacional da Carta da Terra.





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quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Ah! Primavera! Que venha ...o lugar é todo seu!

“Numa primavera, as flores são apenas a colheita do que plantei no outono, do que esperei no inverno das provas, do que semeei no verão. As flores que tenho nas mãos, são apenas os frutos das sementes que plantei para colher nesta inesquecível estação”....


Primas tu pelas estações da vida
mesmo àquelas que te causaram feridas...
Pois no verão veio o bálsamo, mesmo que estivesses achando que no deserto não se poderia extrair belas lições...

Primas sempre pelo verão
pelo outono, pelo inverno
e pela primavera
esperas apenas pelas flores que exalam o perfume doce
pois apesar de crescerem em meio às pedras e cascalhos
não se perderam , nem se ausentaram do caminho
mas continuaram a florir o mundo de espinhos
com versos e prosas e ações
levantando com carinho
o cravo tão embrutecido pelas corrosões....



Tânia Rocha

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Michael Hudson: “Modelo econômico dos EUA está falido”

Economia| 19/09/2010





Michael Hudson: “Modelo econômico dos EUA está falido”

Segundo o economista norte-americano, os EUA impulsionaram um modelo econômico que está falido e, com o advento da mais recente crise econômica global, cabe agora aos países que compõem o Bric (Brasil, Rússia, Índia e China) usar sua força conjunta para colocar em marcha um modelo alternativo: “Quando o EUA diz que os países do Bric ainda têm espaço para aumentar suas dívidas, o que quer dizer é que estes países ainda têm minas que podem ser vendidas e ainda têm florestas que podem ser cortadas. Nos próximos anos, o Norte vai fazer o máximo possível para pegar os seus recursos”, disse Hudson, durante seminário promovido pelo CDES em Brasília.

Maurício Thuswohl

BRASÍLIA - “No cinema, nós já tínhamos o Michael Moore. Agora, na economia, temos o Michael Hudson”. A brincadeira feita pelo conselheiro Jacy Afonso de Melo revela o impacto causado pela intervenção do economista e professor da Universidade do Missouri na quinta-feira (16), durante sua participação em um seminário internacional promovido pelo Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES) em Brasília. Hudson, um ex-economista de Wall Street, mereceu repetidos aplausos dos participantes do seminário ao apresentar, assim como o xará cineasta, um ponto de vista ácido e crítico sobre o modelo econômico de seu país.

Segundo o economista norte-americano, os Estados Unidos impulsionou “um modelo econômico que está falido” e, com o advento da mais recente crise econômica global, cabe agora aos países que compõem o Bric (Brasil, Rússia, Índia e China) usar sua força conjunta para colocar em marcha um modelo alternativo: “Quando o EUA diz que os países do Bric ainda têm espaço para aumentar suas dívidas, o que quer dizer é que estes países ainda têm minas que podem ser vendidas e ainda têm florestas que podem ser cortadas. Nos próximos anos, o Norte vai fazer o máximo possível para pegar os seus recursos”, disse Hudson, em uma de suas muitas frases de impacto.

Hudson afirmou que o governo norte-americano passou 50 anos obrigando os países em desenvolvimento a contrair empréstimos que, na verdade, tinham como objetivo principal a criação de uma infra-estrutura que facilitasse a exportação de grãos, minério e outras matérias-primas para os EUA: “Mais tarde, em sua fase neoliberal, o governo dos EUA perguntou: por quê vocês, para pagar as dívidas que contraíram conosco, não vendem as estradas e portos que construíram com o dinheiro que emprestamos?”, concluiu.

Instituições como o FMI e o Banco Mundial, na visão de Hudson, foram criadas com o objetivo de fazer com que os países em desenvolvimento dependessem dos EUA. Segundo o economista, a adoção do dólar como moeda de parâmetro para a economia mundial foi, ao lado do que qualificou como “dependência militar”, o principal fator de fortalecimento para a hegemonia norte-americana: “Por isso, os Brics podem criar novas estruturas econômicas que não sejam baseadas no poder militar dos EUA”, disse.

Hudson citou o exemplo da China, “a quem os EUA só deixam gastar sua riqueza para comprar bônus do Tesouro americano”, para afirmar que o Brasil, fortalecido pela travessia sem grandes traumas da crise econômica global, pode seguir outro caminho: “O Brasil pode criar os seus próprios créditos, e vocês não precisam de moeda estrangeira para fazer a economia funcionar”.

Novo sistema financeiro
Além de Michael Hudson, outros palestrantes estrangeiros analisaram a conjuntura econômica mundial. Também norte-americano e pesquisador da Universidade do Missouri, Larry Randall Wray pregou a necessidade de criação de um novo sistema financeiro internacional: “Esse sistema deve ter um mecanismo de pagamento sólido e seguro, promover empréstimos menos longos, adotar um mecanismo de financiamento imobiliário sólido e um ativo de capitais a longo termo”, disse Wray, acrescentando que “esses ajustes não precisam ser feitos necessariamente pelo setor privado”.

Diretor do Observatório Francês de Conjunturas Econômicas (OFCE), Xavier Timbeau defendeu a adoção de programas de renda-mínima pelos países em desenvolvimento: “Precisamos adotar novos indicadores de riqueza que não sejam meramente econômicos. Não digam que para reduzir a pobreza basta aumentar o crescimento da economia” disse o economista francês.

O economista mexicano Julio Boltvinick também sugeriu “uma abordagem crítica sobre o paradigma dominante que reduz o bem-estar humano ao bem-estar econômico” e defendeu a adoção de novos conceitos de bem-estar: “Riqueza por si só gera poder, mas não gera necessariamente bem-estar”. Boltvinick defendeu ainda a criação de um índice de progresso social e a adoção de um indicador de tempo livre como formas de medir a desigualdade social em cada país: “Uma sociedade justa tem um tempo livre igualitário”.


Fonte: Agência Carta Maior

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Fogo consome 30% da Chapada dos Veadeiros e parque fecha para visitação

Fogo consome 30% da Chapada dos Veadeiros e parque fecha para visitação


Renato Alves

Publicação: 21/09/2010 14:38 Atualização: 21/09/2010 15:35

Um incêndio que já dura quatro dias consumiu mais de 26 mil hectares da vegetação do Chapada dos Veadeiros, em Alto Paraíso, região Nordeste de Goiás. A área atingida equivale a cerca de 30% da reserva, que ocupa 66 mil hectares de cerrado. Para se ter uma ideia da dimensão do estrago, a área atingida é mais que o dobro queimado no Parque Nacional de Brasília, no incêndio que começou no último domingo (19/9).

Distante 250km de Brasília, a Chapada dos Veadeiros está fechada à visitação pública desde o início do incêndio, na última sexta-feira (17/9). Cerca de 40 brigadistas do Instituto Chico Mendes, órgão responsável pelo parque, e do Ibama, estão no local. Outros 32 bombeiros de Goiânia devem chegar hoje.

Clima
O clima quente e seco continua hoje em Goiás. A temperatura máxima em Goiânia deve chegar a 35º C, por volta das 15 horas. A mínima prevista é de 20º C, e a umidade do ar fica em torno de 18% na capital do estado.

De acordo com o 10º Distrito de Meteorologia de Goiás, o dia será mais quente na Cidade de Goiás (Goiás Velho), na região Centro-Oeste do estado. Os termômetros chegarão hoje a 38º C.

Fonte: Correio Braziliense

Ouvir estrelas (Olavo Bilac)

Ouvir Estrelas

"Ora (direis) ouvir estrelas! Certo
Perdeste o senso!" E eu vos direi, no entanto,
Que, para ouvi-las muita vez desperto
E abro as janelas, pálido de espanto...

E conversamos toda noite, enquanto
A Via Láctea, como um pálio aberto,
Cintila. E, ao vir o sol, saudoso e em pranto,
Inda as procuro pelo céu deserto.

Direis agora: "Tresloucado amigo!
Que conversas com elas? Que sentido
Tem o que dizes, quando não estão contigo?"

E eu vos direi: "Amai para entendê-las!
Pois só quem ama pode ter ouvido
Capaz de ouvir e de entender estrelas".



Poeta Olavo Bilac

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Galbraith diz que progresso social do Brasil é impressionante

Economia| 19/09/2010



Galbraith diz que progresso social do Brasil é impressionante

"É impressionante. Funciona e é algo que deve ser compreendido pelo resto do mundo. Em toda a minha vida, esta é a primeira vez que o resto do mundo está olhando para a América do Sul e para o Brasil como exemplo de algo que funcionou. A população tem aceitado e essa, a meu ver, é a coisa certa a se fazer". As afirmações são do economista James Galbraith, que participou de um seminário promovido pelo Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, em Brasília. Em entrevista à Carta Maior, Galbraith analisa a situação da economia mundial e elogia as políticas de combate às desigualdades sociais em curso no Brasil e em outros países da América Latina.

Cláudia Guerreiro - Especial para Carta Maior

Respeitado internacionalmente por seu posicionamento frente às questões econômicas mundiais, o economista James Galbraith, de passagem por Brasília para participar do Seminário Internacional sobre Governança Global, promovido pelo Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, conversou com a Carta Maior sobre crise, desenvolvimento e capitalismo. Confira:

Na sua opinião, estamos assistindo ao desenvolvimento de um novo ciclo da economia mundial?

JAMES GALBRAITH: Certamente estamos observando um novo ciclo, mas se será caracterizado por desenvolvimento, ainda não está claro. Isso depende da capacidade da comunidade internacional de moldar o caminho futuro da mudança econômica com uma visão estratégica apropriada. Até então, não temos visto isso. O que vemos – e refiro-me aqui aos Estados Unidos e à Europa, que estão no centro da crise – é um esforço para fazer as coisas voltarem ao que eram e fazer com que instituições falidas voltem a funcionar nos mesmos padrões de antes da crise.

O desapontamento que estamos testemunhando com os resultados da economia, me parece ter bastante a ver com o fato de que essa estratégia simplesmente não vai funcionar. Não é um método realista. Não estou separando a crise dos EUA da europeia. O que aconteceu com a Europa foi uma corrida por qualidade. Venderam os bounds e outros investimentos que acharam arriscados. Pensaram que a Grécia, Portugal e Irlanda eram arriscados e compraram títulos do tesouro americano. Fizeram isso porque outros investimentos que tinham, como os relacionados ao mercado imobiliário americano, perderam valor. Então, tentaram proteger sua posição. Não é que tenham descoberto algum ruim sobre a Grécia – todos os investidores sabem há décadas que a Grécia tem problemas: o país não cobra taxas dos ricos e tem os serviços muito amplos e ineficientes –. Isso não é segredo. A verdade é que no ciclo da economia, nos bons tempos você empresta dinheiro para países fracos e nos ruins, para de emprestar. Foi o que aconteceu com a Grécia. Tiraram os investimentos não porque descobriram algo novo sobre o país, mas devido ao que aconteceu nos EUA.

Especialistas dizem que os Estados Unidos estão prestes a sofrer uma nova crise econômica. O que o senhor pensa a respeito?

JG: Acho que ainda estamos trabalhando em um mesmo processo, que na verdade foi tornado inevitável há vários anos devido à falta de habilidade para regular e controlar o sistema financeiro. Isso levou primeiro ao boom, depois à crise e como consequência disso haverá um longo período para saldar as dívidas. E isso é muito mais complicado do que no caso dos países da América Latina nos anos 80. Nesse caso, tinha-se uma única fonte de empréstimo e quando se negociava com ela, vamos dizer bancos internacionais, estava resolvido. Era apenas uma questão de chegar a um ponto em que os bancos concordassem em fazer um acordo ou se o Tesouro Americano estava preparado para enconrajá-los a fazer um acordo, e isso aconteceu em 1989.

Na situação atual, existem milhões de fontes de empréstimo e milhares de credores, porque o financimento imobiliário foi dividido, segurizado e cortado em pedaços e agrupado com todos os outros instrumentos complicados. Então a dificuldade de se chegar a um acordo é muito grande. De fato, em termos práticos, não vai ser possível. O que vai acontecer é que as pessoas vão evitar fazer novos financiamentos. É o que elas vão fazer. O banco é dono da casa, a família vai para algum outro lugar.

O Brasil conseguiu escapar aos efeitos mais perversos das últimas crises. Isso aconteceu porque o governo agiu certo ou foi mera sorte de país emergente?

JG: Nos últimos dez anos, o Brasil tem buscado uma política de incremento, mudanças institucionais e desenvolvimento. Criou um sistema financeiro com inúmeras alternativas aos bancos comercias e completou o ciclo de circulação econômica, aumentando o poder de compra das classes mais pobres. E isso funciona. Há dois países no mundo nos quais você vê um mercado de redução da pobreza extrema: a China é um e o Brasil é outro. A situação da China se aplica apenas a ela. O legado histórico e institucional da China não é algo que alguém adotaria de maneira voluntária: a Revolução Cultural. O que eles fizeram é incrivel, mas tendo como preço um enorme sofrimento e uma sociedade que não é livre.

O Brasil fez isso sob uma democracia funcional, construído sobre princípios sociais essencialmente democráticos que tem sido atacados ininterruptamente por ideólogos neoliberais nos ultimo 30 anos. Ainda assim, aqui observamos, às sombras do modelo econômico da última década, um exemplo de que essa política acarretou um progresso social indiscutível e, mais do que isso, parece ser bem popular. A população tem aceitado e essa, a meu ver, é a coisa certa a se fazer. É impressionante. Funciona e é algo que deve ser compreendido pelo resto do mundo. Em toda a minha vida, esta é a primeira vez que o resto do mundo está olhando para a América do Sul e para o Brasil como exemplo de algo que funcionou.

Em sua apresentação o senhor disse que as pessoas tem uma ideia muito romântica acerca do capitalismo. Como isso ocorre?

JG: Particularmente nos EUA existe, no momento, um discurso político com uma tendência para descrever o país como liberal e com um mercado livre, no sentido da economia capitalista europeia. Isso é uma besteira. Não corresponde aos EUA no qual a população vive. O grande capitalismo liderado pelos bancos e instituições financeiras entrou em colapso em 1929.

A partir do início dos anos 30 o país foi reconstruído, tornando-se totalmente diferente, com um modelo que tinha um forte elemento de companhias privadas, mas no qual instituições cruciais foram estabelecidas por autoridades públicas, pelo New Deal. Nós temos a previdência social, a administração pública de trabalho, o conselho de monitoramento, a autoridade de Tenesee Valley, as indústrias públicas de administração, e poderíamos continuar conversando por muito tempo sobre como o país foi consruído nas décadas de 1930 e 1940. Isso levou a um periodo de prosperidade relativamente estável durante os anos de 1950 e 1960, até chegar à década de 1970.

O que aconteceu depois disso foi um esforço feito por Reagan, e particularmente por Bush (filho), de estabelecer o mundo que existia antes de 1929. Ter um país no qual o verdadeiro poder estava nas mãos do setor financeiro privado. Nessa escolha, existem duas realidades: a primeira é que haverá uma ascensão e queda muito rápidas. E a outra é que eles ainda não desmembraram as instituições existentes dos anos 1930 aos 1960. Então ainda temos previdência social, MedCare... ainda temos grandes instituições que estabilizam a economia e que funcionam. Essa é a razão para a crise não ter sido tão violenta quanto a de 1929. A taxa de desemprego chegou a 10% e não a 25%. O que é chamado de capitalismo não tem sido capitalismo. Esse, ao longo da minha vida, eu não conheci.

Fonte: Agência Carta Maior

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Reportagem de Carta Capital é premiada: Um pouco de atenção…

Reportagem de CartaCapital é premiada

Redação Carta Capital

15 de setembro de 2010 às 17:08h

A reportagem “Um pouco de atenção…”, de autoria de Larissa Brainer, publicada na seção “Brasiliana” da edição 568 de CartaCapital em 12 de outubro de 2009 foi premiada no Concurso de Jornalismo do Grupo Nordeste, cujo tema era “O bem faz bem”.

Leia abaixo, na íntegra, a matéria premiada:

Um pouco de atenção…

E 150 reais bastaram para que o pastor José Alencar salvasse a vida de outro José, um desesperado

por Larissa Brainer

José Carlos da Conceição estava com a aparência de quem havia se perdido há muito. Descalço, com unhas, cabelos e barba enormes. Ladeado por policiais militares e bombeiros, o baiano de 26 anos saía à força do local onde pretendia dar cabo da própria vida. Enquanto José Carlos era algemado, curiosos, que ao longo da manhã interromperam suas rotinas e se aglomeraram para acompanhar o desenrolar da história, gritavam contra ele. “É um marginal. Tem de ser preso”, “Ele precisa de uma surra”, “O que ele quer é roubar”, diziam. O jovem mantinha o olhar fixo, distante.

Um ano antes, José Carlos deixava a cidade de Lauro de Freitas, na Bahia, onde vivia, para buscar trabalho a 800 quilômetros de distância, no Recife. Na capital pernambucana, além de não encontrar o que procurava, trilhou o descaminho. Ao chegar, disse, foi assaltado. Não sobrou nada. Dinheiro, lenço ou documen-to. Começou a vagar pela cidade, a dormir na rua. Virou pedinte. Pedia trabalho e ajuda. O primeiro, não encontrou quem lhe desse. A segunda, com o pouco que recebia tentava vencer a fome diária. À família, avisou apenas que iria viajar, não disse para aonde. “Perdi o contato.”

Pouco antes do dia em que decidira se matar, José Carlos se envolveu em uma briga de bar. Foi esfaqueado, na barriga. Atendido em um hospital público do Recife, teve de enfrentar uma cirurgia. Ficou dias internado. Após receber alta, voltou para as ruas. Raciocinou com a lógica do desespero e foi então à rodoviária. Pensava que no lugar de partidas e chegadas, conseguiria encontrar seu caminho de volta. Pediu em vão auxílio a viajantes. Decidiu dormir no terminal. Acabou expulso uma semana mais tarde.

Sem ter como contatar a família, sem esperança de voltar à Bahia, José Carlos escolheu o suicídio. Na manhã de uma segunda-feira subiu em uma torre de telefonia para se jogar. A cena mudou a rotina de uma movimentada avenida em Jaboatão dos Guararapes, na Grande Recife. A polícia e o Corpo de Bombeiros foram acionados. Um carro e uma equipe de resgate, além de duas viaturas policiais, seguiram para o local.

Os curiosos se acotovelavam nas calçadas, em cima de muros, na rua. O trânsito parou. Nos ônibus, todos os rostos estavam voltados para o alto. As buzinas não cessavam. “Pula logo. Para de chamar a atenção, rapaz”, alguém gritou. Não faltou quem tentasse adivinhar o que o teria levado a tomar tal decisão. “A mulher traiu ele”, disse uma senhora. “Ele é um golpista, faz isso para tirar dinheiro dos outros”, garantiu outro.

Naquela segunda-feira, o pastor evangélico José Alencar Lopes fazia seu trajeto habitual quando viu a movimentação próxima à torre de telefonia. Informou-se a respeito e descobriu que se tratava de uma tentativa de suicídio. “Tentar se matar é coisa de quem está desesperado. Decidi conversar, tentar ajudá-lo. Ajudar os outros faz parte do meu trabalho, do trabalho de Deus”, explicou. Depois de duas horas, com o apoio do pastor, José Carlos foi convencido a descer. E só o fez mediante uma promessa: em troca, receberia auxílio para retornar à Bahia.

José Carlos carregava apenas uma sacola de plástico com o que parecia ser uma rede velha e suja. Seus lábios estavam rachados. O corpo, coberto de feridas. Na barriga, a cicatriz da cirurgia recente. “Não quero ir para hospital. Quero ir para casa. Vocês vão me ajudar? Preciso ir para casa”, repetia. Ao descer da torre, precisou ser escoltado. Ante o desfecho anticlimático, os espectadores tentaram agredi-lo.

Não parou por aí. Na delegacia, policiais checaram sua ficha. Nenhum antecedente. O nada consta criou, porém, outro problema. Liberado e sem ter para onde ir, José Carlos deveria ser encaminhado ao Hospital Psiquiátrico Ulysses Pernambucano. Deixá-lo ao léu seria arriscado. Poderia gerar novo tumulto. Comunicado da decisão, o baiano estacou na porta da delegacia. “Para lá não quero ir não. Para o Ulysses não.” Se fosse, seria a quarta passagem de José Carlos pelo local. Então, pela segunda vez, o pastor José Alencar entrou na história. Contatado pelos policiais, o religioso foi à delegacia e assumiu a responsabilidade pelo rapaz.

Ao pastor, ele relatou sua história. “Aconteceu com ele o que acontece com muitos jovens: não consegue trabalho, nem comida, e acaba se envolvendo com bebida e confusões. Não aparece quem lhe dê a mão, apenas quem lhe mostre o mal. Ele estava sem esperança, faminto há vários dias. Além disso, ninguém quer por perto uma pessoa pobre e fedendo, não é?”, diz. José Alencar ofereceu orientação, abrigo, comida, banho e roupas a José Carlos. “Com a barba feita, cabelo cortado, roupas limpas e banho tomado, ele ficou até bonito, o rapaz”, brinca. O pastor levou o protegido à rodoviária e comprou a passagem de volta para a Bahia. Após um ano, o jovem registrou a perda dos documentos e voltou a existir oficialmente. Quinze para as 7 da noite, embarcou de volta à terra natal.

Durante o tempo em que permaneceu na cidade, José Carlos só foi percebido pelos olhos do poder público nos momentos em que quase morreu. Sua passagem pela estrutura de Saúde do estado e a operação de resgate, quando tentou se matar, custaram aos cofres do governo cerca de 3 mil reais. A atenção dispensada a José Carlos por um cidadão comum solucionou o problema de um ano em uma tarde e com pouco mais de 150 reais. “Acredito que isso deu a ele uma nova chance de ter uma vida digna”, concluiu o pastor, capaz de um gesto humanamente simples.


Carta Capital

Concentração de renda é causa da crise nos EUA e Europa

Concentração de renda é causa da crise nos EUA e Europa



Vicenç Navarro

Economia| 10/09/2010 |

Concentração de renda é causa da crise nos EUA e Europa



Muito se tem escrito sobre os fatores que nos levaram à crise econômica mais importante que atingiu os Estados Unidos e muitos países da União Européia desde a Grande Depressão do início do século XX. Mas pouco se tem dito sobre uma das principais raízes de tal crise, a saber, a enorme concentração de renda em ambos os lados do Atlântico, conseqüência, em grande parte, da aplicação das políticas neoliberais desenvolvidas pela maioria de governos da OCDE (o clube de países mais ricos do mundo) desde os anos oitenta. O artigo é de Vicenç Navarro.

Vicenç Navarro (*)

A revolução neoliberal iniciada pelo presidente Reagan nos EUA e por Thatcher na Inglaterra criou, com a aplicação de suas políticas (diminuição dos impostos dos mais ricos, aumento da regressividade fiscal, flexibilização dos direitos sociais e trabalhistas com o propósito de enfraquecer os sindicatos e a força de trabalho, diminuição do gasto público), um enorme crescimento das rendas superiores a custa das rendas médias e inferiores. Em outras palavras, as rendas do capital dispararam a custa das rendas do trabalho, que diminuíram. Ou seja, em linguagem clara, os ricos ficaram super ricos a custa de todos os demais (classe trabalhadora e classes médias). E aí está a raiz do problema, a realidade mais escondida e silenciada em nossos meios de comunicação.

Olhemos para os dados e analisemos os números do país onde a crise iniciou: os Estados Unidos. Segundo o ex-ministro do Trabalho (no governo Clinton), Robert Reich, no artigo How to end the Great Recession (The New York Times, 03/09/2010), o salário médio do homem trabalhador (ajustado à inflação) naquele país é mais baixo hoje do que há 30 anos. Esta queda forçou as famílias estadunidenses – para manter sei nível de vida - a ter mais integrantes da família trabalhando, sendo essa uma das principais causas de integração da mulher ao mercado de trabalho. Em 1970, apenas 32% das mulheres com filhos trabalhavam; hoje esse índice é de 60%. Outra maneira de compensar a perda de salários foi aumentar as horas de trabalho. O trabalhador, nesta década, está trabalhando 100 horas a mais por ano (e as trabalhadoras 200 horas a mais) do que ocorria há 20 anos.

No entanto, mesmo com essas mudanças, o poder aquisitivo das famílias caiu, empurrando-as para o endividamento. As famílias estadunidenses se endividaram até a medula, e puderam fazer isso porque o aval de suas dívidas, suas casas, ia subindo de preço. Até que a bolha estourou. E agora as famílias têm uma dívida enorme de nada menos que 2,3 bilhões de dólares.

Até aqui fizemos uma descrição do que ocorreu com a maioria da população. Vejamos agora o que se passou com os ricos. O fato de que a massa salarial (a soma dos salários) foi caindo como porcentagem da renda nacional (apesar do aumento do número de trabalhadores) quer dizer que as rendas do capital iam subindo. Isso significa que o crescimento da riqueza do país (o que se chama de crescimento do PIB) beneficiava muito mais as rendas superiores (que derivam sua renda, em geral, da propriedade) do que o resto da população (que extrai sua renda do trabalho). Como conseqüência, os ricos ficaram super ricos. O 1% da população que possuía 9% da renda nacional nos anos setenta do século XX, passou a possuir 23,5% da renda total, o mesmo percentual verificado no início da Grande Depressão, no início do século XX. E aí está o problema. Como diz Robert Reich, os super ricos têm tanto dinheiro que consomem um percentual menor de sua renda em comparação ao que consome o cidadão normal. Ou seja, os 23,5% da renda nacional que controlam são utilizados menos no consumo em comparação à renda das pessoas comuns. A demanda total, que é a que move a economia (pois estimula a criação de empregos e o crescimento econômico) caiu dramaticamente, em parte porque a maioria das famílias perdeu grande capacidade de consumo e os super ricos retiraram do consumo 23,5% da renda total do país, consumindo muito menos do que o cidadão médio.

Como se tudo isso não fosse suficiente, a situação se agravou ainda mais pelo fato de os super ricos depositarem seu dinheiro em paraísos fiscais e/ou investirem em atividades especulativas que têm elevada rentabilidade, como os famosos hedge funds, movimento facilitado pela desregulação dos mercados financeiros. Aí está a raiz da crise financeira e do colapso do sistema bancário, que acabou sendo salvo por fundos públicos, ou seja, impostos, procedentes das famílias profundamente endividadas.

A solução é simples. É preciso implementar uma redistribuição das rendas de modo que o 1% da população volte a ter 9% da renda nacional (na verdade, 3% já seriam suficientes). Assim, o consumo aumentaria e, com ele, o estímulo econômico e a criação de emprego. Além disso, as intervenções redistributivas do Estado gerariam mais recursos públicos, com os quais se poderia, inclusive, criar mais emprego, resolvendo o maior problema que temos hoje, que é o elevado desemprego. Mas os super ricos, junto com os ricos e as classes médias de renda alta (cerca de 20% da população) opõem-se por todos os meios a estas políticas redistributivas. Isso ocorre nos EUA (como o atestamos enormes problemas enfrentados pelo governo Obama em sua tentativa de tributar as rendas mais elevadas e de criar empregos públicos) e também nos países do sul da União Européia, incluindo a Espanha. Estes países têm as maiores taxas de desigualdade de renda da UE, o que explica que sejam também os mais afetados pela crise. Na Espanha, o governo socialista nem se atreve a aumentar os impostos dos super ricos. Isso mostra que a causa da crise é política: a excessiva concentração de poder do poder econômico e político em nossas democracias.

(*) Vicenç Navarro é catedrático de Políticas Públicas da Universidade Pompeu Fabra e professor de Política Pública na John’s Hopkins University. Publicado originalmente na seção de Opinião do jornal “Público”, de Madri.

Tradução: Katarina Peixoto

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Fidel Castro nega ter dito que modelo cubano não funciona mais

Fidel Castro nega ter dito que modelo cubano não funciona mais





Líder cubano afirma que foi mal interpretado por jornalista americano da revista The Atlantic

AFP | 10/09/2010 15:59 - Atualizada às 16:18

Foto: AFP

Líder cubano Fidel Castro participa de apresentação de seu novo livro A Vitória Estratégica na Universidade de Havana

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O líder cubano Fidel Castro assegurou nesta sexta-feira que sua declaração de que o modelo cubano não funciona mais nem mesmo para os cubanos foi mal interpretada pelo jornalista americano da revista The Atlantic, que o entrevistou em Havana.

"Sei o que expressei sem amargura nem preocupação. Divirto-me agora ao ver como ele interpretou ao pé da letra, depois de consultar Julia Sweig, repórter que o acompanhou e elaborou a teoria que expus", explicou.

"A realidade é que minha resposta significava exatamente o contrário do que os dois jornalistas americanos interpretaram", acrescentu o ex-presidente durante a apresentação da segunda parte de seu livro autobiográfico.

"O modelo cubano nem sequer funciona para nós", teria declarado Fidel a Goldberg, segundo a tradução para o inglês publicada na quarta-feira no site http://www.theatlantic.com.

Entrevistado ao longo de vários dias pelo jornalista americano, Fidel Castro adotou um tom de incomum arrependimento sobre fatos do passado, revela a entrevista, que está sendo publicada há dias. Castro, de 84 anos, disse a Goldberg estar arrependido por ter pedido em 1962 ao líder soviético Nikita Kruschev, durante a crise dos mísseis, que atacasse os EUA com armas nucleares caso fosse preciso.

O ex-presidente cubano voltou recentemente à vida pública, particularmente para alertar sobre o risco de uma guerra nuclear no Oriente Médio por causa da disputa entre Israel e Irã.

Na mesma entrevista, Fidel criticou a retórica antissemita usada pelo presidente iraniano, Mahmud Ahmadinejad: "Não acredito que alguém tenha sido mais difamado que os judeus. Diria que muito mais do que os muçulmanos. Foram mais difamados que os muçulmanos porque são acusados e caluniados por tudo. Ninguém culpa os muçulmanos de nada."

Goldberg foi convidado pelo próprio Fidel, que se interessou por um artigo seu sobre as tensões entre Irã e Israel.

Brasil ratifica soberania sobre a “Amazônia Azul”

Brasil ratifica soberania sobre a “Amazônia Azul”

O Diário Oficial da União publicou no último dia 3 de setembro, resolução da Comissão Interministerial para os Recursos do Mar (Cirm) determinando que qualquer nação, ou empresa, que queira realizar pesquisa ou prospectar recursos minerais na Plataforma Continental Brasileira só poderá fazê-lo com autorização do governo brasileiro.

Na resolução, a Comissão determina “aprovar a recomendação da Subcomissão para o Leplac (Plano de Levantamento da Plataforma Continental Brasileira), de que, independentemente de o limite exterior da Plataforma Continental (PC) além das 200 milhas náuticas não ter sido definitivamente estabelecido, o Brasil tem o direito de avaliar previamente os pedidos de autorização para a realização de pesquisa na sua PC além das 200 MN, tendo como base a proposta de limite exterior encaminhada à Comissão de Limites da Plataforma Continental (Clpc), em 2004, e publicada na página eletrônica da ONU”.

O Brasil está entre os dezessete países que apresentaram à ONU pedido de extensão das 200 milhas náuticas fixado pela Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos do Mar. De acordo com o subsecretário para o Leplac, Celso Morais Peixoto, a reivindicação do Brasil corresponde a 960 mil quilômetros quadrados e amplia a área sob jurisdição brasileira (exploração e o aproveitamento dos recursos naturais do leito e subsolo) de 3,6 milhões para 4,4 milhões de quilômetros quadrados.

A resolução argumenta que “os direitos do Estado sobre a Plataforma Continental são independentes da sua ocupação, real ou fictícia, ou de qualquer declaração expressa” e, ainda, a lei brasileira determina que “a investigação científica marinha, na plataforma continental, só poderá ser conduzida por outros Estados com o consentimento prévio do governo brasileiro, nos termos da legislação em vigor que regula a matéria”.

Fonte: Jornal Hora do Povo

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Chantal Mouffe: "A política tem a ver com o conflito"

Chantal Mouffe: "A política tem a ver com o conflito"



Internacional| 08/09/2010



Agência Carta Maior


Chantal Mouffe esteve em Buenos Aires dando palestras na Universidade Nacional Três de Fevereiro. A politóloga afirmou que as diferentes experiências progressistas na América Latina evidenciam que é possível romper com o neoliberalismo. Estudiosa dos novos modelos de democracia, ela garante que na Argentina está se dando um processo de democratização da sociedade e que o projeto hegemônico “deve ganhar mais setores da classe média”. Chantal Mouffe concedeu entrevista para Mercedes López San Miguel do Página/12.

Mercedes López San Miguel - Página/12

Chantal Mouffe esteve em Buenos Aires dando palestras na Universidade Nacional Três de Fevereiro. A politóloga afirmou que as diferentes experiências progressistas na América Latina evidenciam que é possível romper com o neoliberalismo. Do seu corpo frágil surge uma voz firme e constante. É um castelhano falado por uma belga casada com um argentino. Junto ao filósofo e marido Ernesto Laclau escreveu Hegemonia e estratégia socialista.

Chantal Mouffe tomou de Hannah Arendt a visão da política como pluralidade para depois dizer que Arendt fala da pluralidade como meio para conseguir o consenso. O ponto principal da teoria de Mouffe é que o conflito é central porque algumas posições são irreconciliáveis em uma democracia agonista. Por isso Mouffe revisou a ideia de conflito do filósofo Karl Schmitt.

Estudiosa dos novos modelos de democracia, garante que na Argentina está se dando um processo de democratização da sociedade e que o projeto hegemônico “deve ganhar mais setores da classe média”. Chantal Mouffe concedeu entrevista para Mercedes López San Miguel do Página/12, 06-09-2010. A tradução é do Cepat, publicada originalmente no IHU Online.

Eis a entrevista.

Sua tese teórica reivindica a confrontação, isso parece contradizer a suposta busca de consenso que muitos postulam na Argentina…

O objetivo da democracia não é que todo mundo se coloque de acordo, há posições irreconciliáveis. Critico as tradições teóricas que dizem que a política democrática busca consensos. Habermas indica que o consenso se busca através de processos deliberativos, argumentos racionais. Eu não concordo com ele. A política tem a ver com o conflito e a democracia consiste em dar possibilidade aos diferentes pontos de vista para que se manifestem e se desentendam. O dissenso pode se dar mediante o antagonismo amigo-inimigo quando se trata o oponente como inimigo – no extremo levaria a uma guerra civil – ou através do que chamo agonismo: um adversário reconhece a legitimidade do oponente e o conflito se conduz através das instituições. É uma luta por hegemonia.

Está intimamente ligada ao que você postula em seu livro "Em torno ao político" acerca de um ‘nós’ frente a um ‘eles’…

Sim. Toda política tem a ver com a formação de “nós”. Nao se pode formar um “nós” sem um “eles”. Qualquer identidade coletiva implica dois: os católicos não se definiriam sem os muçulmanos; as mulheres sem os homens. A ideia de que se poderia chegar a um nós inclusivo completamente é impensável teóricamente.

Desse ponto de vista, qual é o “outro” do governo kirchnerista nesta instância de final do seu mandato?

Não é o outro, são os outros: uma série de interesses que se opõe à democratização do país.

Por exemplo?

O grupo Clarín e todos os que tratam de monopolizar os meios de comunicação. O governo, um governo progressista tenta dar pluralidade de informação. Vejo claramente onde está o outro. Os grupos econômicos tratam de monopolizar o poder o mais que podem e o governo de impedi-lo. Essas forças que tentam manter seus privilégios e controle, e representam também os setores do campo; o outro vai mudando segundo as circunstâncias. Quando se trata de democratizar uma sociedade, torná-la mais plural e igualitária, enfrentar-se-ão grupos de poder.

Ernesto Laclau afirmou em uma recente entrevista a este jornal que o modelo argentino é superior às sociais-democracias do Uruguai e Chile (governo de Bachelet). Concorda?

Os modelos do Uruguai e do Chile são mais próximos à social-democracia europeia. Ao contrário, na Argentina a tradição peronista é muito importante o que a torna mais específica. Há na América do Sul uma série de governos progressistas de diversas índoles – Hugo Chávez na Venezuela, Evo Morales na Bolívia, Rafael Correa no Equador e os Kirchner na Argentina – que foram para além da ruptura com o neoliberalismo que Tabaré Vázquez e Michelle Bachelet. Na reunião de Mar del Plata tanto no Uruguai como no Chile votaram a favor do projeto de Bush e da ALCA. Tabaré depois tentou estabelecer relações bilaterais, ‘namorou’ com um tratado de livre comércio com os Estados Unidos. Tampouco, se pode dizer que são reacionários, são menos progressistas.

Na região está se dando uma disputa entre os governos de esquerda e uma direita com discurso republicano que está sendo apoiada pelos meios de comunicação. Como vê isso?

Em todos esses países que mencionei aconteceu um processo de democratização. Venezuela é muito mais democrática com Chávez do quando era governada pelo Copei ou Ação Democrática, nem é preciso falar da Bolívia. As condições dependem do grau de institucionalização da sociedade civil. Na Venezuela tem-se uma situação muito mais polarizada e a sociedade civil é muito mais débil comparada com a Argentina. Porque há oposições a esses governos?, é a mesma oligarquia que reage contra os processos de democratização. Na Venezuela, um caso paradigmático, os poderes nunca aceitaram a legitimidade de Chávez, ainda que esse tenha ganhado todas as eleições em que participou. Tratam Chávez como um inimigo, com tentativas de golpes de Estado. No caso da Argentina, o projeto hegemônico deve procurar ganhar o apoio da maior parte dos setores para avançar no processo de democratização. Quando em um país há uma classe média bastante desenvolvida, setores dessa classe média podem ser conquistados.

Na concepção teórica de Schmitt, o soberano pode decidir por um estado de exceção. Às vezes o soberano pode ser o povo. Isto é aplicável à crise de 2001 na Argentina e a queda de Sánchez de Lozada na Bolivia?

Schmitt pensa sobre o papel do direito e que para além do direito está a política, sempre há situações excepcionais que podem não seguir as leis. É uma discussão que tem a ver com o constitucionalista Hans Kessel se a lei é inquestionável. Schmitt dizia que não, que mesmo na democracia há situações de exceção, há alguém que decide e é o soberano. Todo o pensamento liberal trata de eliminar a soberania, o papel do soberano. O mesmo Schmitt dizia: há conflito. O político tem a ver com o conflito.

Você tem uma visão positiva do populismo?

Depende se é populismo de esquerda ou de direita. O populismo não é uma palavra ruim, porque acredito que na política democrática há uma construção de um povo. A esse elemento chamo populismo, a descrição de um povo. O que Gramsci chamaria de uma vontade coletiva, o nacional-popular. Esse povo pode construir-se de modos diferentes. Exemplo, na Europa os movimentos populistas que estão ganhando terreno são de direita porque constroem o povo mediante um antagonismo com os imigrantes, é o caso de Le Pen na França. A xenofobia é uma característica do populismo de direita. Ao contrário, a construção nossa é em confrontação com os grupos econômicos, o populismo de esquerda.

Como por exemplo?

O de Chávez, definitivamente. O povo venezuelano se define contra os opressores, os poderosos.

Do seu ponto de vista, as sociais-democracias europeias fracassaram e tem muito que aprender da América Latina…

A situação dos partidos chamados de centro-esquerda é preocupante. Ao denominarem-se “centro” esquerda se distanciaram do progressismo. Por exemplo, a Terceira Via de Blair aceitou a hegemonía neoliberal. Na Europa entre a centro-direita e a centro-esquerda não há grandes diferenças. A consequência disso é que as pessoas votam cada vez menos. E cria um terreno fértil para que os partidos de direita populista se posicionem, dêem a impressão de que são uma alternativa de mudança. A crise financeira de 2008 poderia ser uma oportunidade para que uma verdadeira esquerda democrática apresentasse uma alternativa ao modelo neoliberal. Não foi o caso. Todos esses partidos de centro-esquerda aceitaram a ordem neoliberal e contribuiram em alguns casos para essa ordem, como o fez o novo trabalhismo britânico. Não se pode ser ao mesmo tempo o responsável pela crise e sua ‘salvadora’. Isto reforçou os partidos conservadores. O único país da Europa em que se tem uma esquerda ainda fortalecida é na Alemanha. O partido "A Esquerda" quer realizar uma transformação das instituições. A crise foi uma oportunidade perdida, de todos os modos, a confiança no neoliberalismo se perdeu e mesmo os partidos de centro-esquerda se conscientizaram da necessidade de se apresentarem como uma alternativa. Tenho um otimismo moderado. As experiências latino-americanas são importantes para nós, mostram que se pode sair do neoliberalismo.

domingo, 5 de setembro de 2010

Famílias cantam emocionadas para mineiros presos há um mês em mina

Famílias cantam emocionadas para mineiros presos há um mês em mina


Parentes dos 33 mineiros presos em uma mina do norte chileno cantaram, tocaram buzinas e choraram neste domingo às 13h45 locais (14h45 de Brasília), um mês depois do desabamento que os deixou sepultados a 700 metros de profundidade, constatou a AFP.

"Vamos, vamos mineiros, que esta noite vamos retirá-los...", cantaram os familiares, que subiram junto com o ministro da Mineração, Laurence Golborne, em uma colina próxima à mina onde tremulam 32 bandeiras chilenas e uma boliviana, pela nacionalidade de cada um deles.

"Ao completar-se um mês, lembramos cada um de nossos 32 mineiros e um boliviano que, a esta altura, teremos que adotar", disse o ministro, que depois leu os nomes de todos.

Várias pessoas choraram e houve momentos de tensão, quando alguns se irritaram com a imprensa. "Saiam, merda", gritou uma mulher em prantos para os fotógrafos que a cercavam. O ministro pediu que a polícia retirasse os repórteres e cinegrafistas.

"Um pouquinho de respeito, por favor!", pediu Golborne.

Pouco antes, houve o hasteamento da bandeira chilena e o hino nacional foi cantado.

"Fico com pena porque não eram para estar lá completando um mês na mina. Deveriam estar com suas famílias", disse à AFP María Segovia, irmã do mineiro Darío Segovia.

"Ele está bem, a única coisa que quer é sair o quanto antes", acrescentou.

Os 33 mineiros ficaram presos em 5 de agosto e apenas 17 dias depois as autoridades conseguiram estabelecer contato e confirmar que todos estavam vivos.

Desde então, as equipes de resgate iniciaram uma troca de comunicações com os mineiros e a enviar alimentos e outros objetos.

Da AFP/Paris

Fonte: Diário de Pernambuco

Soube que me amava !

O agir de Deus é lindo!